"Falar com os olhos nunca falha"
Sou observador por natureza e a frase que servi de título para este artigo a encontrei afixada num poste nos arredores do Parque Areião, enquanto fazia minha caminhada. Tenho o hábito de olhar placas, cartazes e outdoors em todo lugar e, algumas vezes, sou surpreendido com algo impactante no meio dos anúncios. Acabamos nos acostumando com os excessos, com a poluição visual, e não percebemos as sutilezas do tempo presente.
Falar com os olhos é um hábito que precisa ser recuperado. Falar com os olhos exige a simples, porém árdua, tarefa de olhar. Um parêntese: muitas vezes vemos e não olhamos. Ver faz parte da nossa visão, é algo físico-biológico. Já o olhar exige um esforço da alma, nos remete a algo mais profundo, um mergulho na vida interior. A superficialidade, a pressa, a distração, o desinteresse, a indiferença e tantos outros fatores podem indicar o nosso desvio nessa prática tão salutar. Precisamos reaprender a olhar, mas também precisamos reaprender a ver. Precisamos redescobrir o sentido da visão para compreender a grande da ação olhar.
O filósofo Aristóteles, no livro Metafísica, afirma que a visão nos proporciona mais conhecimento. É o esforço empreendido pelo pensador, nesse tratado, de estabelecer a relação entre sabedoria e conhecimento. A Heráclito de Éfeso, outro filósofo antigo, é atribuída a seguinte sentença: “os olhos são testemunhas mais exatas que os ouvidos”. Os antigos parecem ter razão e usavam com eficiência este sentido. Precisamos reaprender com eles a dar mais atenção aos nossos sentidos.
Na mensagem para o 55º Dia Mundial das Comunicações Sociais, o Papa Francisco utiliza, a partir do Evangelho, os verbos ir e ver como o método para a comunicação autêntica. Ele insiste que “na comunicação, nada pode jamais substituir, de todo, o ver pessoalmente. Algumas coisas só se podem aprender, experimentando-as. Na verdade, não se comunica só com as palavras, mas também com os olhos, o tom da voz, os gestos”.
Precisamos recuperar o falar com os olhos, estimulando a plena comunicação pelos sentidos para não corrermos o risco de cair numa outra epidemia: a da cegueira. É sobre isso que o escritor português José Saramago trata na emblemática obra Ensaio sobre a Cegueira (1995). “Por que foi que cegamos, não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que veem, Cegos que, vendo, não veem.”
O desafio está posto.
Marcus Tullius
Mestrando em Comunicação pela Pontifícia Universidade Católica de Minas (PUC-Minas). Filósofo e publicitário. Coordenador geral da Pascom Brasil e membro do Grupo de Reflexão em Comunicação da CNBB. É autor do livro Esperançar: a missão do agente da Pastoral da Comunicação, pela Editora Paulus.
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