Sociedade brasileira adere à vacinação de crianças contra a Covid
A desconfiança, alimentada por ondas de desinformação, é desestimulada por instituições como a Igreja Católica com suas pastorais e movimentos que defendem a imunização dos pequenos. Confira a 1a parte dessa reportagem
A Covid-19 já matou mais de 1.400 crianças de zero a 11 anos no Brasil e deixou outras milhares com sequelas. Quem informa é o Instituto Butantã, que completa que “a doença está entre as dez principais causas de morte de crianças e é causa de síndrome que afeta coração e pode matar”.
Mas os dados evoluem, assim como a transmissão de novas cepas da Covid. Até o fechamento desta reportagem, números do Observatório Covid Fiocruz atestavam que em sete estados brasileiros a ocupação dos leitos de UTI Covid-19 ultrapassava 80%. O Distrito Federal chegou a sua ocupação máxima e, segundo a Secretaria de Saúde local, 90% dos internados são pessoas que não se vacinaram ou que estão com o ciclo vacinal incompleto.
E é diante desse cenário que o Ministério da Saúde segue provocando confusão, desinformação e medo quanto à segurança da vacinação da população, em especial das crianças, ao emitir e editar notas confusas e que contrariam orientações de seus próprios cientistas. O ministro Marcelo Queiroga, por exemplo, vem sugerindo a pais, mães e responsáveis a consultarem médicos antes de vacinarem suas crianças. Algo bastante irracional para famílias usuárias do Sistema Único de Saúde (SUS), que chegam a esperar até três meses por uma consulta.
Angotti Neto, responsável pelo setor de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, também protagonizou um ataque à saúde ao publicar uma nota técnica classificando a hidroxicloroquina como eficaz para tratar a Covid-19. Alvo de críticas, a tabela do documento que deixava clara a indicação do uso de cloroquina foi retirada pelo Ministério (confira a seguir).
O Supremo Tribunal Federal (STF) cobrou da Procuradoria-Geral da República (PGR) uma manifestação sobre o atraso na vacinação de crianças contra a Covid-19. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a vacina da Pfizer para crianças de cinco a 11 anos de idade em 16 de dezembro de 2021. Apesar da autorização, o governo federal decidiu fazer uma consulta pública sobre o tema e encerrou as discussões apenas em 5 de janeiro. Antes, contudo, pela primeira vez na história do país, realizou uma audiência pública para discutir o tema.
Confira no link abaixo acesso à audiência pública realizada pelo governo federal sobre a vacinação de crianças contra a Covid-19:
https://www.youtube.com/watch?v=7kGAd2_C8zQ&t=1s
Embora especialistas tenham se esforçado para apresentar os resultados de pesquisas e da própria vacinação em adultos, o que se viu foi palco para o negacionismo científico.
População busca a vacina
Ao passo que o governo federal segue desgovernado, desinformando e tirando a paz e a confiança de pais e responsáveis em torno da imunização de crianças contra a Covid-19, famílias inteiras estão buscando suas doses nos postos de saúde de todo o Brasil. Em Guarulhos, cidade onde esta repórter vive e se imuniza, não é diferente.
“Foi um alívio tomar a vacina, porque vou poder ir para a escola sem ter aquele peso na consciência que se eu pegar Covid eu posso até morrer. Fico mais tranquila”, contou Sofia Souza Pinto, de 12 anos de idade. Ela reconheceu que não está sendo fácil passar pela pandemia. “Eu perdi muitos amigos por conta dessa doença. Aí acabou que eu perdi a escola e fiquei bem afastada de pessoas assim. Agora, se Deus quiser, em breve volta tudo com todo mundo imunizado”, disse a irmã mais velha de Maria Eduarda, que estava ali para ser imunizada.
Maria Eduarda de Souza Pinto tem 11 anos e é a caçula de Jaqueline Gonçalves Souza, 50 anos, que tem outros dois filhos. Portadora de deficiência intelectual e com episódios de epilepsia, ela não deu muita bola para a reportagem, mas segurava com certo apego o livro que acabara de ganhar: Um Livro em Branco, de Theo Oliveira, uma iniciativa da Prefeitura de Guarulhos para incentivar a vacinação e a leitura.
Maria Eduarda (a frente) com a mãe Jaqueline e a irmã Sofia (Foto: Karla Maria)
“Eu fiquei feliz porque estava muito ansiosa. Principalmente devido à situação dela. Foi a que mais eu tive medo de ter alguma complicação com a covid pela sua condição. Tive medo de ir pra um hospital, de ter alguma complicação”, contou a mãe de três filhos imunizados. “Olha, como mãe, pra mim foi um alívio, uma conquista. Eu fiquei muito feliz porque é uma sensação de a gente ter calma em casa. Todas as vezes que eu vejo um jornal percebo a quantidade de pessoas que estão se infectando e fico muito preocupada em relação às crianças. Então, agora, sinto-me aliviada sim, porque os meus três estão vacinados,graças a Deus”, disse a mãe mostrando o cartão de vacinação de Maria Eduarda. Dia 18 de março ela volta ao Ambulatório da Criança, no centro de Guarulhos, para a segunda dose.
As crianças de Jaqueline também foram vacinadas no Ambulatório da Criança e do Adolescente, localizado na Rua Oswaldo Cruz, logradouro que homenageia o médico epidemiologista e sanitarista brasileiro. Não podia ter nome de rua mais simbólico para abrigar um ambulatório que se preocupa com a saúde coletiva. Pois é ali e em outros 30 postos da cidade que a gestão municipal espera imunizar 132.781 crianças entre cinco e 11 anos contra a Covid-19. No Brasil, esse número alcança cerca de 20 milhões de pequenos.
“Tem que trazer. Tem que trazer as crianças para se vacinarem sim. O benefício é maior que tudo. Tem que pensar que a saúde deve estar em primeiro lugar.O SUS e a vacina salvam vidas. Vamos pensar que desde o nascimento até os dias de hoje a gente toma vacina e estamos aqui firmes e fortes graças a isso”, disse Daiane de Melo Ramazine Azevedo. Ela é mãe de Daniel Augusto Ramazine Azevedo, de 11 anos. “Fiquei ansioso pra tomar a vacina, mas não teve quase nada de ruim”, disse sobre a picada que acabara de receber.
Daiane e o filho Daniel Azevedo (Foto: Karla Maria)
“Durante a pandemia a gente ficou muito tempo em casa, não fomos para a escola. Penso que agora eu vou poder fazer mais coisas que eu não conseguia fazer”. Perguntei o que ele gostaria de fazer e a resposta apertou o coração: “Vou ficar mais próximo da minha avó”, contou lembrando dona Lindava, de 65 anos, que mora pertinho, mas separada por um quintal e um vírus.
Daniel levou para casa o livro Nandi, o Boi da Índia, e isso porque gostou da capa, do boi. Depois, mãe e filho fizeram uma foto, ganharam um saquinho de pipoca e seguiram pelo centro da cidade debaixo de um sol de 33ºC.
A iniciativa de doar livros partiu do prefeito Guti que, ao lado de seu irmão Felipe Costa, lançou em 2014 a obra Salve o Anjinho da Guarda (Editora Canaviela). Entre as opções de livros entregues pela Prefeitura de Guarulhos estavam também os títulos O Caso do Patinho que se Achava Feio e O Menino Nelson Mandela. Entre os pequenos, a já citada obra Um Livro em Branco, naquele dia, era a mais desejada.
Foi com ela que a pequena Laura dos Santos, de seis anos foi para casa. A entrevistada mais jovem e fofa desta reportagem falou sobre sua vacinação. “Não doeu nem um pouquinho. Eu vim porque a mamãe falou pra vir. Eu falo ‘pras’ crianças tomarem vacina para ficarem muito bem”, disse a menina que já foi diagnosticada com Covid-19.
Tataine e as duas "Lauras" (Foto: Karla Maria)
“Ela pegou de um amiguinho da escola. Teve contato com ele em uma quarta-feira e na sexta-feira ela teve febre. Foram três dias de febre, aí eu achei estranho. Quando levei ao médico deu positivo. Já eu fiquei bem ruim. Sentia muita dor nas pernas, muita dor de cabeça, mas durou uns seis dias, no meu caso, porque eu já tinha tomado as duas doses, então foi mais fraco. O caso dela foi bem tranquilo”, contou Tatiane Gláucia dos Santos Santana, 35 anos, assistente fiscal e moradora de Guarulhos.
Tatiane se disse preocupada com rumores de amigas que não querem vacinar seus filhos. “Para mim, está claro que é uma questão política, porque a gente nunca desconfiou de vacina, e de repente você tem um componente político que bagunça essa situação sanitária. Eu tenho algumas amigas que falam que não vão levar os filhos”.
Tatiane e sua filha estavam acompanhadas por outra Laura bem consciente, e já imunizada com a primeira dose. Era Laura Eduarda, de 12 anos. Seu depoimento emoldura o impacto emocional que nossas crianças atravessam em meio ao caos de informações provocado por aqueles que deveriam garantir saúde e segurança aos pequenos brasileiros. “Eu estou bem feliz, porque vou poder voltar pra escola. Vou ter mais aprendizado e segurança. Ficarei um pouco em paz, porque sei que não vou pegar Covid, e se pegar não vai ser tão forte. Se vocês tiverem oportunidade pra vacinar, vacinem”, disse a dona de um par de óculos azuis e um “paz e amor” pronto para a foto.
(continua)
Comentários
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Ana Maria Dos Santos
Sou vó das Lauras e mãe da Tatiane, me sinto orgulhoso por minhas meninas estarem vacinadas, assim temos um pouco de segurança ao voltarem as aulas... graças a Deus a vacina chegou pra elas.. Por que o ano passado minha Laurinha foi contaminada na escola por um amiguinho.
#vacinasalvavidas
#vivaosus
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